quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Uma náusea, um rabisco.


Tudo isso é forçado. Tudo isso é muito forçado. Hoje acordei sem expressão, sem nome, sem identidade, revirei todos os cantos da casa, do escritório, da alma: nada, não achei nada. É como se tivesse sumido, tudo, sem deixar rastros. Aquilo que diz quem eu sou, que eu sou, que eu existo: é como se nunca tivesse existido, cara. Essa sensação é muito estranha, o corpo formiga e o tempo para, fiquei quase uma hora fitando o origami pendurado na janela do meu quarto, - enfeite querido, presente antigo, de pessoa que gosto muito- não consegui, se quer consegui lembrar como foi a entrega desse presente, daquele dia, acho que era aniversário, ou nem tinha comemoração, não sei direito, cara, realmente não lembro, só lembro do sorriso largo que acompanhava o presente, ou imagino... sei lá, acho que imagino como história que alguém conta enquanto mata o tempo, enquanto acende um cigarro à espera do ônibus, qualquer coisa assim. Estranho, estranho.

Fito outro ponto. Volto. Prepotência minha chamar isso aqui de "meu quarto", de "m-e-u", isso aqui não é meu, nunca foi, não tem nada de alma aqui, nem lembranças, nada, aqui é só um lugar que eu uso pra fugir do sono, do cansaço. Aqui eu quase não sonho. Lembro que eu sonhava bastante antes, eu me lembro até de ter tido fé em alguma coisa um dia, nem faz tanto tempo. Eu queria ter uma vida normal, sabe? Arrumar um emprego melhor, fazer uma faculdade, passear no parque aos finais de semana - de mãos dadas-, ir à missa, ter um bom relacionamento com os vizinhos, queria transar por amor, todos os dias da minha vida. Queria ser mais cautelosa, menos impulsiva, mais compreensiva. Juro que eu queria que fosse assim, eu tentei tanto, sabe? De verdade. Mas a oportunidade de ouro nunca vem, o intelecto é medido pela habilidade de decorar coisas, o parque é longe, chove demais, as pessoas não tem mais o hábito de dar as mãos, Deus mudou de casa e não deixou endereço, os vizinhos não entendem hábitos noturnos, o amor é facilmente substituído. O amor vai embora, um dia vai, sabe? E o corpo continua precisando de outro corpo, de outra ilusão. O corpo é fraco, o ser humano é fraco, instintivo, raça superior o caralho, somos movidos por cheiros, aparências, gostos, como qualquer outro animal. Amor é sexo, sexo é amor. Eu tentei... isso dói muito cara, porque eu sei que eu tentei tanto fazer tudo certo, eu acreditei, sempre que eu pensava em desistir eu ouvia o som reproduzido pela tua voz, naquele dia x, naquele segundo x : "vamos tentar", e eu segui tentanto, mas então você parou. E se foi. Porra, você tinha me convencido a tentar e quando eu aceito a ideia você decide que não era nada disso? Isso foi injusto, cara, muito. Eu tinha me entregado, de corpo, de alma, eu parei de ter medo.Você me golpeou de morte. Mas eu sobrevivi, foi difícil, eu me refiz, mas falta, sabe quando falta? Eu não sei onde procurar, me roubaram, cara, eu tenho que aprender a conviver com essa ausência sóbria de alguma coisa que eu não sei o que é. Não quero mais acreditar em nada não, vou ficar parada. Agradável? Mornidão é a temperatura do vômito, amor. Escolha? Escolha porra nenhuma, você está iludido, você está doente, como todo o resto.

Esquece. Tá tudo bem. Eu aceito. Eu engulo. Eu me entrego. Amanhã, talvez...Tudo bem.



"Parou de chover. Não sei qual o Deus padroeiro das cartas - mas de qualquer maneira a noite de hoje foi dedicada a ele. Hoje eu queria que alguém me dissesse que eu não precisava me preocupar - como no Last Picture Show - um ombro, uma mão. Desculpe tanta sede, tanta insatisfação. Amanhã recomeço."



"Pedi pra mãe: Me interna, tô infeliz pra caralho."



Ouvindo: Nada vai mudar isso - Cássia Eller

3 comentários:

The Sole Survivor disse...

eu esqueci o que ia comentar, mas depois eu me lembro.



acho que a vida pode ser muito cansativa.

e sozinho se definha bem mais rápido.

saudades daquele apartamento, daquele sofá vermelho que até nome tinha e das tardes frias assistindo TV enquanto conversávamos.


PS: acho que vc entende o que é "poesia". depois eu te explico o pq disso.

Cáh Villa. disse...

cantei essa musica hoje o dia todo e quando cheguei li esse texto lindo que expressa extamente o que eu tô sentindo de algumas coisas.

Unknown disse...

Tira os "caras" do texto ja falei...
te entendo, se fudemo igual...

paiz pro barraco